Será que obrigar comerciantes a exibir o Código de Defesa do Consumidor leva à maior garantia de direitos dos clientes? Exibir peça de propaganda pedindo que motoristas “parem e pensem” leva à mudança de comportamento? O contribuinte sonega apenas com base em um cálculo de custo e benefício? Uma janela quebrada em uma comunidade leva a crimes mais sérios?
O radar das organizações e governos tende a ser povoado frequentemente por questões como essas. O ponto central que vai definir a qualidade das decisões que pretendam enfrentar essas questões é o embasamento na metodologia científica.
A maioria das questões em Administração é passível de ser estudada experimentalmente, como tem sido feito nas grandes universidades do mundo. Hoje a Administração tem muito pouco de “arte”. A questão é, assim, como aplicar a mentalidade científica à solução dos problemas que enfrentamos, pois somente dessa maneira é possível atuar nas causas que comprovadamente levam aos efeitos esperados.
A evolução da economia comportamental (behavioral economics) nas últimas décadas descortinou uma série de vieses que levam a decisões ruins e comportamentos pouco eficientes. Pior, hoje se sabe que esses vieses são sistemáticos, isto é, ocorrem regularmente, mas passam despercebidos. Sabe-se também que uma parcela enorme do que diz o senso comum sobre o comportamento humano é simplesmente errada. O efeito disso nas organizações são decisões tomadas com base em mera intuição, opinião, usos e costumes ou fórmulas prontas, mas que ou não produzem o resultado esperado ou são contraprodutivas. Um problema central em decisões baseadas apenas em opinião reside no fato de a evolução ter nos programado para sempre querer ter razão, em uma espécie de contabilidade moral egocêntrica. Quantas vezes se viu alguém recuar de uma opinião e reconhecer a superioridade da opinião alheia?
Karl Popper, há algumas décadas, deu um passo fundamental no estudo do conhecimento, com a defesa do princípio da falseabilidade. Isso implica que uma teoria que não possa ser testada e que não possa estar sujeita a ser falsificada é inútil. Somente teorias que tenham sobrevivido ao duro teste empírico de suas hipóteses e ao confronto com explicações alternativas podem avançar o conhecimento e a prática humana: nesse ponto, não há nada tão prático como uma boa teoria. Mas nem sempre o quadro é tão claro, pois não é incomum haver evidência mista sobre uma teoria. Isso requer uma competência analítica nas organizações para discernir o conhecimento científico de primeira linha, o que envolve a compreensão do processo científico, de métodos quantitativos sofisticados e dos vieses cognitivos que afligem a avaliação de causa e efeito. Quando essa competência não existe, é comum que as organizações se rendam às fórmulas prontas – que geralmente padecem de rigor científico.
A mentalidade científica na resolução de problemas sociais ou organizacionais vai além da busca do conhecimento científico mais atualizado. Envolve um passo maior, que é a disposição para testar abordagens novas, utilizando-se do método experimental sempre que possível, de modo que a gestão seja embasada em evidências e não em opinião ou usos e costumes. O emprego de projetos-piloto é um bom exemplo nesse sentido. Porém esse esforço costuma acarretar um grande desconforto nos líderes que se propõem a ser inovadores. De um lado, a abordagem científica dos problemas é “senso incomum”, o que requer que se ponha de lado as opiniões prévias na análise das evidências e se considere que eventos ou comportamentos geralmente não têm uma única causa simples. De outro lado, o questionamento da cultura organizacional sobre o modo “certo” de fazer as coisas tende a gerar oposição, pois a cultura atua de forma invisível, ao fornecer os modelos mentais que servem para analisar (e distorcer) os fatos e ao gerar anticorpos contra a mudança, que favorecem sua natural tendência à perpetuação.
A mente humana precisa de estabilidade cognitiva. A cultura, os vieses e os modelos mentais que possuímos cumprem essa função. No âmbito das organizações, todavia, essa bagagem é insuficiente para garantir decisões de boa qualidade. No fundo a questão principal reside no que se chama tecnicamente de regulação epistêmica: como você constrói seu conhecimento? Como você muda suas crenças? A Administração efetiva tem de ser baseada em evidências e na ciência, como vêm percebendo as organizações nos últimos anos.