Paternalismo tem uma reputação ruim. E maternalismo?

Dan Ariely fez uma sugestão bem interessante, nesses tempos de culto quase absoluto ao individualismo, especialmente nos EUA, mas algo que vem crescendo também no Brasil. O culto ao individualismo justifica, por exemplo, apoiar o armamento individual, mesmo quando as evidencias mostram que isso aumenta os homicídios e não tem os efeitos preventivos que alguns grupos alegam. Leia o que disse o Ariely sobre o tema paternalismo aqui.

Opiniões são como filhos

Deparando-se com a escolha entre mudar a própria visão de mundo e provar de que não há nenhuma necessidade disso, quase todo o mundo vai se ocupar de achar a prova. (John K. Galbraith, economista)
Mudar nossos modelos mentais é mais desconfortável do que perder um olho ou um membro, disse o fundador da Visa, Dee Hock, em seu livro autobiográfico.
Frequentemente, em reuniões e encontros informais, nos deparamos com a seguinte situação: alguém apresenta uma opinião, às vezes construída na hora, sobre o assunto em discussão e se aferra àquela opinião como se fosse uma parte de seu corpo da qual não pode abrir mão ou como se fosse um filho. É um fenômeno que o economista comportamental Dan Ariely batizou com muita propriedade de Efeito Ikea.  A conversa então se torna uma conversa de surdos e, se for uma reunião organizacional, prevalece quem tem mais poder.
Essa é uma característica humana, mas que pode ser superada por esforço individual (raro), mas principalmente por meio de processos de decisão bem estruturados (em se tratando de discussões que visam à solução de problemas pessoais ou organizacionais). Essa característica, todavia, nos divide em atividades como grupos de discussão pela Internet, em que a falta de contato pessoal ainda favorece a animosidade. Reconheço que a tentação de opinar sobre os diversos temas é por vezes muito forte ou irresistível.

A metáfora do trabalho

O vídeo a seguir vale a pena ser visto. Dan Ariely (Univ. de Duke) é um dos principais expoentes da economia comportamental e um dos acadêmicos de maior influência mundial. Uma das áreas de seu interesse é justamente a motivação e o trabalho. No vídeo ele aborda, com base nas evidências científicas, alguns fatores motivacionais fundamentais no contexto de trabalho: o sentimento de significado e propósito no trabalho, a necessidade de reconhecimento do esforço dos profissionais, o sentimento de se sentir dono do trabalho realizado. Eis o link: http://www.ted.com/talks/dan_ariely_what_makes_us_feel_good_about_our_work.html

Um tema complementar ao tratado por Ariely é o que abordo a seguir.

O livro Metaphors we live by (1980/2003), escrito pelos linguistas George Lakoff e Mark Johnson, trata do papel que as metáforas ocupam na percepção e organização da maior parte das ideias de nossa cultura. Esse tipo de abordagem, embora pareça eminentemente teórica, ganhou a atenção de diversas organizações nos últimos anos. Tem sido utilizada, por exemplo, em pesquisas com consumidores e em redesenho de produtos e serviços.

Dentre as inúmeras metáforas abordadas no livro, os autores tratam do modo como nós conceituamos o trabalho. Segue um trecho importante, em tradução livre, que deixo para reflexão – mas que é uma reflexão direcionada, com duas perguntas: (1) Com que frequência vocês se pegam pensando em assuntos de trabalho quando não estão “oficialmente” trabalhando? e (2) Em que situações o trabalho é prazeroso?

“Ao considerar trabalho como um tipo de atividade, a metáfora assume que ele pode ser claramente identificado e separável daquilo que não é trabalho. A metáfora tem por pressuposto que nós conseguimos separar o que é trabalho e o que é lazer e separar o que é atividade produtiva e o que é atividade não produtiva. Esses pressupostos obviamente não correspondem fielmente à realidade em boa parte do tempo, exceto talvez em linhas de produção de fábricas, em prisioneiros sujeitos a trabalhos forçados etc. A visão de que trabalho é meramente um tipo de atividade – independentemente de quem o executa, de como ele é percebido ou qual o significado que ele agrega à vida do trabalhador – esconde aspectos como: o trabalho tem significado? ele é satisfatório? é humano?”.

(…)

“A metáfora de trabalho e do tempo como recursos esconde todas as possíveis concepções de trabalho e tempo que existem em outras culturas e em algumas subculturas de nossa sociedade: a ideia de que trabalho pode ser divertido, de que a inatividade pode ser produtiva e de que muito do que classificamos como trabalho ou não tem nenhum propósito claro ou seu propósito é inútil”.